O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, participou nesta terça-feira (19) de dois eventos virtuais: no primeiro, realizado pela Escola Superior de Advocacia do Rio de Janeiro (ESA/RJ), o ministro discutiu o impacto do novo coronavírus (Covid-19) nos tribunais brasileiros; no segundo, ele debateu o tema “Pandemia e políticas públicas” na XII Semana Jurídica, promovida pelo Centro Universitário IESB.
No evento da ESA/RJ, o presidente do STJ foi acompanhado pelo coordenador de processo civil da escola, Marcelo Mazzola, e pelo professor do Instituto Brasiliense de Direito Público, Osmar Paixão. Noronha lembrou as sérias consequências causadas pela pandemia de Covid-19, a qual comparou a uma guerra em que o inimigo ainda é desconhecido.
De acordo com o ministro, o cenário é de graves prejuízos para as empresas, que muitas vezes permanecem fechadas, mas continuam arcando com alta carga tributária. Outras, ponderou, têm obtido mais sucesso durante a pandemia, como os segmentos de farmácias e as empresas que trabalham como delivery.
Noronha defendeu que o Judiciário permaneça ativo e ágil nesse momento de disseminação do vírus, mas que haja uma análise individual dos casos, com a verificação de questões como a onerosidade excessiva para as empresas e a necessidade de auxílio ou intervenção do poder público.
“É preciso evitar, na perspectiva do Judiciário, a generalização da crise. Nem todas as empresas precisarão, por exemplo, de revisões contratuais ou de dispensa do pagamento de suas obrigações. O momento é difícil, mas precisamos, agora, de muita ação e de muita prudência. Ação no sentido de tomar as medidas corretas e rápidas, mas, ao mesmo tempo, prudência na adoção dessas medidas”, afirmou o ministro.
Investimentos
Em relação às medidas para continuidade da prestação jurisdicional durante a pandemia, João Otávio de Noronha mencionou que o STJ fez alto investimento em tecnologia nos últimos anos, o que agora permite ao tribunal manter uma elevada produtividade, mesmo com ministros e servidores trabalhando de forma remota.
Entre as iniciativas adotadas está a implementação das sessões por videoconferência, que são realizadas de maneira muito semelhante aos julgamentos colegiados presenciais, permitindo inclusive que os advogados façam sustentação oral.
Segundo o ministro, assim como tem sido feito com sucesso no STJ, é necessário que os tribunais de todo o país adotem soluções para que os processos tenham seguimento normal em primeira e segunda instâncias – por exemplo, o atendimento de advogados por teleconferência e a realização de oitivas e outros atos processuais por meios virtuais.
Em relação ao cenário pós-pandemia no âmbito do STJ, Noronha defendeu que, mesmo com a retomada das sessões presenciais, as experiências dessa fase de isolamento social sejam aproveitadas em vários níveis, a exemplo da realização de sessões extraordinárias a distância e, em situações excepcionais, de sustentações orais por meio virtual.
Triagem
No debate realizado pela ESA/RJ, o presidente do STJ também abordou outros assuntos, como as iniciativas para a redução do acervo processual da corte. Uma das ações mais recentes foi a criação de um sistema de triagem para identificar recursos cuja controvérsia já tenha sido apreciada em recurso especial repetitivo ou que, por conta da afetação da controvérsia para o rito dos repetitivos, deveriam estar sobrestados. Nesses casos, citou Noronha, os recursos não chegam a ser distribuídos para os ministros, evitando uma tramitação desnecessária.
Mesmo assim, o ministro apontou a necessidade de modificações estruturais mais amplas, como a aprovação, pelo Congresso Nacional, do chamado “filtro de relevância” para o recurso especial. Para Noronha, o mecanismo possibilitará ao STJ se concentrar no julgamento de questões com repercussão nacional e privilegiará as instâncias ordinárias nos casos em que suas decisões não ultrapassarem os interesses das partes do processo.
Semana Jurídica
Em sua participação na XII Semana Jurídica do Centro Universitário IESB, Noronha falou sobre a atuação do Judiciário durante a atual crise de saúde pública.
Segundo o ministro, a primeira providência tomada pelo Judiciário foi manter os trabalhos jurisdicionais. “O STJ não sucumbiu à crise sanitária e não se paralisou. Ao mesmo tempo, implementou o necessário isolamento social. Nesse momento, é muito importante que o tribunal continue exercendo a função jurisdicional na sua plenitude”, afirmou.
Para o ministro, após o fim da pandemia, o Brasil vai precisar superar as diferenças ideológicas para conseguir se reorganizar, investir mais em educação e saúde e atrair investimentos para ajudar na retomada da economia.
“Estamos em guerra, mas o inimigo é invisível. Temos as consequências da guerra, como recessão, queda do PIB, aumento de ações judiciais… Mas do que precisamos no Brasil nesse momento é uma alta dose de bom senso, para adotar medidas políticas e judiciais. O Judiciário não pode tudo, só o que a Constituição permite fazer”, comentou.
Desafios
O presidente do STJ disse ainda que o Brasil terá grandes desafios a enfrentar no futuro. “Vamos precisar redesenhar a economia brasileira, redesenhar a saúde pública. Precisaremos redesenhar a própria política brasileira a partir dessa crise”, concluiu.
O ministro acrescentou que o STJ deve começar a retomar o trabalho presencial em agosto. “Nossa ideia é que o STJ volte aos poucos com as sessões físicas. Nada justifica colocar nossas vidas em risco. Temos alternativas tecnológicas, instrumentos para que a Justiça não pare. Vamos usá-los. E vamos continuar cuidando do jurisdicionado, para que possamos concretizar o que prevê a Constituição Federal, apesar da pandemia”, disse.
O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, participou do debate e falou sobre as ações de seu governo no combate ao coronavírus. Também participaram do evento virtual o reitor do IESB, Edson Machado de Sousa Filho, e a coordenadora do curso de direito da instituição, professora Any Ávila – moderadora do debate.