O presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, participou na manhã desta segunda-feira (6) da abertura do seminário O Direito Processual Civil nos 30 Anos do STJ. Realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) em parceria com o STJ, no auditório do tribunal, o evento reuniu magistrados e outros especialistas da área jurídica.
Temas relevantes do direito processual foram abordados ao longo do dia, em debates que combinaram análises históricas e reflexões sobre o futuro do processo civil no país. Os professores do IBDP Osmar Paixão e Alexandre Freire compuseram a mesa de abertura. O ministro Noronha falou sobre “A evolução do direito processual civil nos 30 anos do STJ”.
“Talvez seja a matéria mais estudada no Brasil. Nenhuma outra disciplina conseguiu unir, em torno de si, uma pesquisa tão grande quanto o processo civil. Neste ano, em que o STJ comemora 30 anos da sua instalação, atuando como grande guardião do direito federal infraconstitucional – e nesse conceito se insere o Código de Processo Civil –, parece-me muito oportuno este seminário”, declarou o presidente.
Evolução histórica
Ao tratar da história do direito processual civil brasileiro, Noronha destacou a criação do Regulamento 737, de 1850 – editado para regular causas comerciais –, que marcou o progresso no direito processual. O ministro lembrou a divisão do poder de legislar sobre a matéria que foi estabelecida entre a União e os estados, bem como o fracasso do sistema – reparado pela Constituição de 1937, que atribuiu à União a competência legislativa sobre o tema. As reformas legislativas e a responsabilidade do STJ de interpretar as leis federais e, em consequência, o CPC foram outros pontos abordados pelo presidente.
Por fim, Noronha desejou constância à corte em seu propósito constitucional, para que continue concretizando o direito material com eficiência. “Se assim entendermos, se tivermos em nossa consciência de julgadores a necessidade de ver o processo como instrumento autêntico de justiça, afastando subterfúgios e concretizando princípios, acredito que o STJ vai desempenhar a contento sua missão constitucional de ser o guardião da ordem jurídica, sobretudo no campo do processo civil”, concluiu.
Precedentes qualificados
No primeiro painel da manhã, o ministro do STJ Mauro Campbell Marques destacou pontos relevantes sobre a formação de precedentes qualificados no tribunal. Ele também lembrou o empenho de ministros e servidores para aprimorar a gestão de precedentes. “O STJ se preocupa com a tese a ser firmada em cada repetitivo porque entende que a decisão tem efeito vinculante”, citou o ministro ao falar do zelo dos ministros com a formação da jurisprudência.
Mauro Campbell Marques apresentou dados para demonstrar o alcance das decisões tomadas em recursos repetitivos pelo STJ. Nos últimos dois anos, a Primeira Seção julgou 29 temas, “destravando pelo menos 597.713 processos que aguardavam definição, número que pode ser muito maior, considerando os casos que não estavam computados no sistema”. Tais números, segundo o ministro, justificam a ênfase dada à gestão de precedentes.
De acordo com o ministro, o ideal seria o STJ não analisar processos que não deveriam chegar a uma corte de precedentes. Ele mencionou como exemplos recursos que discutiam a propriedade e guarda de um papagaio, a tributação a ser aplicada na importação de girafas e o cabimento de habeas corpus para tutelar direitos de chimpanzés.
Segurança jurídica
Na sequência, a professora Teresa Arruda Alvim reforçou a necessidade de preservar a segurança jurídica quando os tribunais estabelecem ou modificam a jurisprudência. Ela lembrou que as “guinadas na jurisprudência” necessitam estar devidamente fundamentadas, já que é preciso reflexão e muita ponderação antes de se modificar um entendimento.
Tereza Alvim apontou também o papel da modulação dos efeitos. “É uma parte fundamental para garantir segurança jurídica, coerência e confiança perante o jurisdicionado. É recomendável que essa modulação não prejudique o particular, parte vulnerável nesse processo.”
A professora citou alguns motivos utilizados para justificar a alteração na jurisprudência, tais como a mudança de opinião dos magistrados ou na composição dos tribunais. Para ela, o Judiciário deve ter cuidado para não ficar alterando frequentemente a jurisprudência, especialmente quando não existem razões técnicas para tal mudança.
Racionalização
O segundo painel, presidido pela professora Estefânia Viveiros, contou com a participação do ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseverino e teve como tema Julgamentos repetitivos no Superior Tribunal de Justiça.
Sanseverino falou a respeito do conceito de demandas repetitivas e da utilização dos recursos repetitivos na racionalização dos trabalhos no tribunal em tempos de contingência de recursos e aumento contínuo da demanda processual.
“Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, são aproximadamente 100 milhões de processos, mais de 1 milhão de advogados e apenas 18 mil juízes. A solução é racionalizar o trabalho. A formação de precedentes qualificados traz não só agilidade nos julgamentos, mas também segurança jurídica e isonomia”, disse.
Participou ainda da mesa como palestrante o professor Osmar Paixão, que ressaltou a lacuna existente para os casos de superação dos precedentes. Ele propôs uma reflexão sobre quais instrumentos poderiam ajudar a minimizar esses gargalos legais, e como exemplo mencionou o uso da reclamação e dos recursos, além da não vinculação de casos futuros.
“Os recursos repetitivos são um instrumento fundamental nesse novo contexto objetivo. A legislação muito bem regulamenta a criação e a aplicação dos precedentes. O que falta? O que falta é uma especificação, feita no caso do regimento do STJ, mas ainda não tão feita no regimento do Supremo, das hipóteses de revisão”, comentou o professor ao questionar como os não legitimados poderiam suscitar uma nova forma de pensar em relação a um paradigma já firmado.